
quarta-feira, 30 de abril de 2008
domingo, 27 de abril de 2008
Indicadores Sociais de Desenvolvimento
Por Cristine de Carvalho
A crescente preocupação com a elaboração de indicadores sociais, considerados instrumentos de planificação governamental, surge num momento crítico da história contemporânea, em que o ceticismo e a desilusão a respeito do crescimento econômico, tal como apregoado e definido durante três décadas, se expandem rapidamente e permeiam largos círculos acadêmicos, políticos e administrativos.
Durante mais de um quarto de século, o crescimento econômico tinha sido apresentado como meta e valor supremo para as sociedades ocidentais e orientais, desenvolvidas e subdesenvolvidas. Passando a ser considerado o único caminho capaz de solucionar os graves problemas de habitação, saúde, alimentação, educação e emprego que afligem essas sociedades.
A avaliação dos resultados da Primeira Década de Desenvolvimento das Nações Unidas (1960-1970)[2], bem como da situação social em países que experimentaram uma expansão acelerada, nos últimos anos, parece indicar uma correlação, antes insuspeita entre crescimento econômico e deterioração da situação social, sendo freqüente o agravamento das desigualdades e das contradições internas nas sociedades em vias de desenvolvimento. A abordagem tradicional do crescimento econômico enfatizava apenas a expansão da renda. Mas o índice de desenvolvimento humano (IDH), o desempenho econômico dos países e o PIB per capita não podem ser considerados como únicos indicadores de seu desenvolvimento.
Os estudos de Ravallion (2004) com dezenas de países ao longo do século XX mostram que os indicadores econômicos, de crescimento do capital físico, não apresentam uma tendência segura de crescimento do capital social, ou seja, de melhorias na qualidade de vida da população e de redução das desigualdades provocadas pelo próprio crescimento econômico.
No Brasil, a velha idéia de que “é preciso deixar crescer o bolo para então dividi-lo”, proeminente nos anos 70, durante o período chamado “Milagre Brasileiro”, mostrou que esta tendência alavancou a entrada de capital financeiro, mas não se confortava a realidade social de um país cujo histórico é de dominação e autoritarismo de elites privilegiadas. O resultado foi uma enorme e ainda recente péssima distribuição de renda. O bolo cresceu mas foi dividido de forma bastante desigual.
Resumindo, enquanto as capacidades produtivas elevaram a produção mundial a mais de 25 quatrilhões de dólares, as polarizações sociais cresceram acentuadamente. Segundo informes da Organização das Nações Unidas (1998), 358 pessoas são possuidoras de uma riqueza acumulada superior à de 45% da população mundial (Tranning, 2006).
Ao verificar-se que o crescimento acelerado não leva necessariamente à maior equidade e justiça social, tornou-se primordial o exame da viabilidade de caminhos e instrumentos alternativos para a consecução do objetivo último – uma sociedade justa, equilibrada e democrática.
Nos últimos quinze anos, a nova abordagem do desenvolvimento a partir do desenvolvimento Humano emergiu, se difundiu e consolidou, não só nos meios acadêmicos e entre os formuladores de políticas públicas, mas também em segmentos como a mídia, as empresas e a sociedade civil organizada.
Essa abordagem, inspirada por Amartya Sen, economista que ganhou o Prêmio Nobel de Economia de 1998, vê como objetivo último do desenvolvimento o aumento das capacidades e habilidades das pessoas, a ampliação das suas possibilidades de ser e fazer aquilo que valorizam, e de expandir as liberdades humanas. A abordagem do desenvolvimento humano ressalta a importância da ampliação das escolhas humanas nos campos econômico, social, político e cultural.
Neste trabalho, pretendo apresentar a história da construção dos indicadores sociais como medidas de desenvolvimento de uma sociedade; uma importante ferramenta de informação sobre as suas características construídas ao longo do tempo.
A pobreza, como sabemos, não se restringe a um PIB baixo. Mas tem sua expressão na mortalidade infantil, na baixa expectativa de vida, no alheamento da cultura, nas perseguições de raça e gênero, no trato despótico das diferenças, no ressurgimento de doenças erradicáveis.
Durante mais de um quarto de século, o crescimento econômico tinha sido apresentado como meta e valor supremo para as sociedades ocidentais e orientais, desenvolvidas e subdesenvolvidas. Passando a ser considerado o único caminho capaz de solucionar os graves problemas de habitação, saúde, alimentação, educação e emprego que afligem essas sociedades.
A avaliação dos resultados da Primeira Década de Desenvolvimento das Nações Unidas (1960-1970)[2], bem como da situação social em países que experimentaram uma expansão acelerada, nos últimos anos, parece indicar uma correlação, antes insuspeita entre crescimento econômico e deterioração da situação social, sendo freqüente o agravamento das desigualdades e das contradições internas nas sociedades em vias de desenvolvimento. A abordagem tradicional do crescimento econômico enfatizava apenas a expansão da renda. Mas o índice de desenvolvimento humano (IDH), o desempenho econômico dos países e o PIB per capita não podem ser considerados como únicos indicadores de seu desenvolvimento.
Os estudos de Ravallion (2004) com dezenas de países ao longo do século XX mostram que os indicadores econômicos, de crescimento do capital físico, não apresentam uma tendência segura de crescimento do capital social, ou seja, de melhorias na qualidade de vida da população e de redução das desigualdades provocadas pelo próprio crescimento econômico.
No Brasil, a velha idéia de que “é preciso deixar crescer o bolo para então dividi-lo”, proeminente nos anos 70, durante o período chamado “Milagre Brasileiro”, mostrou que esta tendência alavancou a entrada de capital financeiro, mas não se confortava a realidade social de um país cujo histórico é de dominação e autoritarismo de elites privilegiadas. O resultado foi uma enorme e ainda recente péssima distribuição de renda. O bolo cresceu mas foi dividido de forma bastante desigual.
Resumindo, enquanto as capacidades produtivas elevaram a produção mundial a mais de 25 quatrilhões de dólares, as polarizações sociais cresceram acentuadamente. Segundo informes da Organização das Nações Unidas (1998), 358 pessoas são possuidoras de uma riqueza acumulada superior à de 45% da população mundial (Tranning, 2006).
Ao verificar-se que o crescimento acelerado não leva necessariamente à maior equidade e justiça social, tornou-se primordial o exame da viabilidade de caminhos e instrumentos alternativos para a consecução do objetivo último – uma sociedade justa, equilibrada e democrática.
Nos últimos quinze anos, a nova abordagem do desenvolvimento a partir do desenvolvimento Humano emergiu, se difundiu e consolidou, não só nos meios acadêmicos e entre os formuladores de políticas públicas, mas também em segmentos como a mídia, as empresas e a sociedade civil organizada.
Essa abordagem, inspirada por Amartya Sen, economista que ganhou o Prêmio Nobel de Economia de 1998, vê como objetivo último do desenvolvimento o aumento das capacidades e habilidades das pessoas, a ampliação das suas possibilidades de ser e fazer aquilo que valorizam, e de expandir as liberdades humanas. A abordagem do desenvolvimento humano ressalta a importância da ampliação das escolhas humanas nos campos econômico, social, político e cultural.
Neste trabalho, pretendo apresentar a história da construção dos indicadores sociais como medidas de desenvolvimento de uma sociedade; uma importante ferramenta de informação sobre as suas características construídas ao longo do tempo.
A pobreza, como sabemos, não se restringe a um PIB baixo. Mas tem sua expressão na mortalidade infantil, na baixa expectativa de vida, no alheamento da cultura, nas perseguições de raça e gênero, no trato despótico das diferenças, no ressurgimento de doenças erradicáveis.
Em meio
Gestão do Intangível e a valorização do capital social na economia
Por Cristine de Carvalho para a Agencia Comunicarte de Responsabilidade Social
Na atual Era do Conhecimento, as sociedades deixaram a Era do Tangível para entrar na Era do Intangível. Alguns fatores sinalizam essa transição, como a globalização, a valorização das questões locais e culturais, o aumento exponencial das pressões da sociedade organizada (com o crescimento das ONGs, por exemplo), a mudança de foco de empresas tradicionais, a relevância econômica e cultural das multinacionais, a migração da hegemonia do capital de países para empresas, o crescimento do número de fusões e aquisições, as fraudes contábeis, o crescimento da Internet, o aumento generalizado da insegurança individual, profissional e social, o fortalecimento do profissional do tipo VOCÊ SA., e assim por diante (DOM, 2006).
Desta forma, tendo a sociedade sido remodelada a partir de novas técnicas de informação, é necessário buscar também técnicas capazes de apreender os impactos dos conteúdos conhecidos e das mudanças estruturais percebidas, tanto no cotidiano das operadoras de serviços, empresas e governos, como dos indivíduos em rede. Uma das formas avaliar as mudanças do capital humano já vem sendo promovidas, os Indicadores sociais cumprem esse papel.
No entanto, conceitos como “confiança”, “comunidade” e “redes” – fatores fundamentais na composição do capital social, são abordados por muitos estudiosos do tema como de difícil operacionalização (quantificados e qualificados), haja visto que não basta identificar o número de componentes das redes (ligações e nós), mas sim apreender a sua importância para a comunidade. É, portanto, um desafio para os pesquisadores e, principalmente, para aqueles interessados em usar o capital social para promover o desenvolvimento, é conseguir explicar que existem retornos mensuráveis a partir do crescimento do capital social.
Uma das principais linhas a que se tem chegado ao se avaliar o impacto do capital social na economia de uma empresa, por exemplo, tem sido avaliar o valor da marca desta empresa, frente à sua aceitação pública. Hoje em dia, o crescimento do Marketing e da Publicidade, aliada ao Design de Logomarcas e formas de conceitualização produto-público-alvo são fortes estratégias de aliança entre os “recursos e significados” construídos em sociedade e “a imagem e a reputação” de uma instituição, e até mesmo de uma governança estatal.
O capital social é uma forma de capital, e, embora sua definição seja alvo de discussão na ciência econômica, algumas características parecem se destacar em alguns estudos, como a não-ocorrência de retornos decrescentes; que o capital social se aprecia com o uso (não se deprecia, portanto); é produzido coletivamente a partir das relações sociais existentes nas comunidades, mas seus benefícios até então não podiam ser antecipadamente mensurados. Embora possua características de bem público, observa-se nele um aspecto único, qual seja, a sua produção é, necessariamente, coletiva.
Na atual Era do Conhecimento, as sociedades deixaram a Era do Tangível para entrar na Era do Intangível. Alguns fatores sinalizam essa transição, como a globalização, a valorização das questões locais e culturais, o aumento exponencial das pressões da sociedade organizada (com o crescimento das ONGs, por exemplo), a mudança de foco de empresas tradicionais, a relevância econômica e cultural das multinacionais, a migração da hegemonia do capital de países para empresas, o crescimento do número de fusões e aquisições, as fraudes contábeis, o crescimento da Internet, o aumento generalizado da insegurança individual, profissional e social, o fortalecimento do profissional do tipo VOCÊ SA., e assim por diante (DOM, 2006).
Desta forma, tendo a sociedade sido remodelada a partir de novas técnicas de informação, é necessário buscar também técnicas capazes de apreender os impactos dos conteúdos conhecidos e das mudanças estruturais percebidas, tanto no cotidiano das operadoras de serviços, empresas e governos, como dos indivíduos em rede. Uma das formas avaliar as mudanças do capital humano já vem sendo promovidas, os Indicadores sociais cumprem esse papel.
No entanto, conceitos como “confiança”, “comunidade” e “redes” – fatores fundamentais na composição do capital social, são abordados por muitos estudiosos do tema como de difícil operacionalização (quantificados e qualificados), haja visto que não basta identificar o número de componentes das redes (ligações e nós), mas sim apreender a sua importância para a comunidade. É, portanto, um desafio para os pesquisadores e, principalmente, para aqueles interessados em usar o capital social para promover o desenvolvimento, é conseguir explicar que existem retornos mensuráveis a partir do crescimento do capital social.
Uma das principais linhas a que se tem chegado ao se avaliar o impacto do capital social na economia de uma empresa, por exemplo, tem sido avaliar o valor da marca desta empresa, frente à sua aceitação pública. Hoje em dia, o crescimento do Marketing e da Publicidade, aliada ao Design de Logomarcas e formas de conceitualização produto-público-alvo são fortes estratégias de aliança entre os “recursos e significados” construídos em sociedade e “a imagem e a reputação” de uma instituição, e até mesmo de uma governança estatal.
O capital social é uma forma de capital, e, embora sua definição seja alvo de discussão na ciência econômica, algumas características parecem se destacar em alguns estudos, como a não-ocorrência de retornos decrescentes; que o capital social se aprecia com o uso (não se deprecia, portanto); é produzido coletivamente a partir das relações sociais existentes nas comunidades, mas seus benefícios até então não podiam ser antecipadamente mensurados. Embora possua características de bem público, observa-se nele um aspecto único, qual seja, a sua produção é, necessariamente, coletiva.
A Rede Invisível: tecnologias de informação e as formas de inclusão
Por Cristine de Carvalho para a Agencia Comunicarte de Responsabilidade Social
“No final do século XX, vários acontecimentos de importância histórica transformaram o cenário social da vida humana.”. Assim inicia o “Prólogo: a Rede e o Ser”, do livro “Sociedade em Rede, de Manuel Castells. Segundo o autor, uma revolução tecnológica concentrada nas tecnologias da informação começou a remodelar a base material da sociedade em ritmo acelerado. Economias do mundo todo passaram a manter interdependência global, apresentando uma nova forma de relação entre a economia, o Estado e a sociedade em um sistema de geometria variável (Castells, 2005).
Desta forma, o caráter fluido da informação, a base da geração do conhecimento e da ação social, teve sua relevância econômica e política investigada em várias áreas do conhecimento – desde a ciência da informação, a sociologia, a economia, até a ciência política.
A rede na economia remete à idéia de “comportamento” corporativo entre indivíduos, empresas e atores políticos a fim de receber “vantagens em rede”. Estes benefícios pertencem à sociedade e são realizadas por parceiros independentes que agem de forma autônoma.
No mercado empresarial, o formato em rede caracteriza a relação entre as várias fases da cadeia produtiva (Marteleto, 2004). Conectados eletronicamente, estes empreendedores se unem em redes fluidas e temporárias para produzir e vender mercadorias e serviços. Com a conclusão do seu trabalho, a rede se dissolve e os seus membros ficam novamente independentes, circulando na economia à cata de novas encomendas.
Do ponto de vista político, Börzel (1998) elucida a conclusão de estudiosos do tema, onde rede é um “conjunto de relações relativamente estáveis, de natureza não-hierárquica e interdependente, que vinculam uma variedade de atores que compartilham interesses comuns com relação a uma política e que trocam recursos para satisfazer esses interesses compartilhados, reconhecendo que a cooperação é a melhor maneira de atingir objetivos comuns.”.
Na concepção científico-tecnológica, a última década trouxe para a cadeia produtiva o conceito de rede. Com a larga difusão dos computadores pessoais no mercado e o impulso à utilização da telemática (Internet) como veículo de informação, grandes mudanças passaram a caracterizar a comunicação entre os indivíduos e os meios de se trabalhar. Também podendo ser chamada de rede invisível pela desmaterialização da produção, muitos processos começavam e terminavam via computadores e internet.
Para aqueles que puderam ser incluídos na nova rede por motivos econômicos e pessoais (de renda e de adaptação, por exemplo), os benefícios são a velocidade e a facilidade na interação entre indivíduos distantes tanto fisicamente quanto culturalmente, o que leva a maiores oportunidades de conhecimento – ainda que de maneira superficiais. Além destes, o uso da informática trouxe dispositivos ao crescimento de iniciativas individuais e de micro empresas – onde por exemplo todo um mercado virtual já existe.
No entanto, estes benefícios não são acessíveis a todos aqueles que gostariam de tê-lo. A maioria dos produtos de consumo condensa conhecimento científico e tecnológico e o acesso a eles é condição de integração na vida civilizada, como afirma Bernardo Sorj (2003). Tanto em termos de qualidade de vida como em chances de inserção na sociedade em geral e no mercado de trabalho em particular.
Como afirmou o Dr. Jorge Werthein (2003), ainda quando era diretor da UNESCO no Brasil, e atual diretor-executivo da RITLA[1], “o crescimento das redes e aplicações das tecnologias de informação e comunicação não garante, por si mesmo, os fundamentos das sociedades o conhecimento. Para construí-la é necessária a escolha política sobre quais são as metas desejáveis, principalmente para que se possa ampliar o acesso eqüitativo à educação e ao conhecimento. Essa é uma tarefa de todos e se insere no processo coletivo de superação da exclusão digital, uma das dimensões da desigualdade social”[2].
[1] Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana
[2] Retirado do Prefácio de “Brasil@povo.com”.
A rede de confiança
Por Cristine de Carvalho
Como mostra Saraiva (2002), na prática, a rede é um conceito largamente operacional que permite construir novas realidades e modificar sistemas já existentes. No entanto, nas várias esferas da produção, os principais desafios da inter-relação na rede de trabalho são: a promoção da confiança interpessoal, do crédito e da ética; os entraves da coordenação dada a diversidade de pessoas/organizações fora das fronteiras tradicionais; a negociação com a ausência de hierarquia, pelos acordos “ganha-ganha”; a necessidade de capacitação digital, para a conectividade e como fonte de informação; a construção de relações estáveis e de produtividade, mesmo com tamanha diversidade; e a necessidade de controle e do clima amistoso de liberdade.
Francis Fukuyama discute em Confiança, que as relações sociais influenciam o desempenho econômico, tanto de uma organização como de uma nação. Indicadores de bem-estar e de capacidade de competir, por exemplo, mostram as condições e a abrangência do nível de confiança entre os agentes da sociedade civil – empresas, sindicatos, igrejas, clubes, associações comunitárias, ONG´s e mídia, entre outros.
Para Fukuyama (2002) a economia está permeada pela cultura e depende dos valores morais e da confiança social. Assim, este autor e Putnam enfatizam o papel da confiança para a prosperidade de uma nação, e, para ambos, confiança é a base para o capital social. “Confiança é a expectativa de reciprocidade”, do corpus mínimo, de coesão (Carneiro, 1996), “que pessoas de uma comunidade, baseadas em normas partilhadas, têm acerca do comportamento dos outros. Quem sente e sabe que pode confiar, recebe mais colaboração e aproveita melhor as oportunidades que aparecem” (D´Araujo, 2003). Ou ainda, segundo Marteleto (2004), o nível de confiança (e expectativa) entre os indivíduos da rede está relacionado com o capital social cognitivo e influencia a ação coletiva do grupo.
Concluindo, Fukuyama apresenta o primeiro grande ensaio de integração das visões econômicas e socioculturais a partir da realidade dos anos 90. O autor cria uma escala de sociabilidade para avaliar o chamado “capital social”, o potencial que os indivíduos de uma determinada cultura têm para trabalhar juntas visando objetivos comuns em grupos e organizações. Esta sociabilidade, por sua vez, decorre do grau em que as comunidades compartilham normas e valores, mostrando-se dispostas a subordinar o individual e o coletivo. Desses valores compartilhados nasce a confiança, tema central de seu livro.
O que se constata na prática, como por exemplo, nos estudos da RedeSist[1] sobre os arranjos locais, é a necessidade de levar em conta as características culturais, econômicas e políticas em que todos os atores sociais aproveitam oportunidades surgidas da combinação da posição deles em redes sociais e da estrutura dessas redes, podendo – ou não – resultar no que Schmitz chama de “eficiência coletiva” (Maciel, 2002).
[1] Rede de Pesquisa em Sistemas Produtivos e Inovativos Locais: www.ie.ufrj.br/redesist
Capital social e desenvolvimento
Por Cristine Carvalho
Apesar de ser um conceito complexo, podemos apreender o aspecto essencial do desenvolvimento, como apontou Amartya Sem, economista indiano, colaborador na construção do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), e Prêmio Nobel de economia em 1998: “o desenvolvimento seria a ampliação da capacidade de realizar atividades livremente escolhidas e valorizadas” (KAAS, 2005). Porém, tal ampliação não se dá automaticamente com o crescimento econômico, sem primeiro rever-se “como” se está crescendo.
Levando-se em consideração que o capital social assume diversas formas em razão do contexto e das características dos indivíduos que o constituem, ele tem diversas identidades. Tendo seu próprio espaço e tempo de ação, os recursos captados e transformados em capital social têm seu ritmo de desenvolvimento particular. Diferentes meios, diferentes pessoas e diferentes realidades quando observadas de outra sociedade.
Em tempos atuais, é fundamental compreender que cada grupo ou comunidade tem seu ritmo e é incabível julgar certezas de bem-estar social quando estes recursos e valores devem ser relativizados. Não há valores numéricos que indiquem que uma dada sociedade é bem-sucedida. As variáveis econômicas não bastam para produzir desenvolvimento socialmente equilibrado e ambientalmente sustentável.
Assim, os fundamentos e as práticas freqüentemente contraditórias do desenvolvimento econômico vêm sendo veementemente criticadas e os temas sociais e institucionais vem ganhando boa aceitação no mainstream da economia, tornando-se então uma coisa só e reformulando o conceito de desenvolvimento.
OLSON (1982 apud MONASTERIO, 2000) faz uma interessante analogia em relação aos estudos econômicos que procuram contabilizar o crescimento: “Eles não traçam as fontes do crescimento em suas causas fundamentais; traçam a água do rio aos córregos e lagos de onde vem, mas eles não explicam a chuva”.
Ineficiente ao identificar valores relativos ao conteúdo das sociedades, seus recursos e seus trejeitos estão as teorias do evolucionismo social. Gilbert Rist é um dos principais críticos aos projetos de desenvolvimento sob esta “crença ocidental”. Neste modelo comparativo os países sub-desenvolvidos deveriam atingir o patamar dos países desenvolvidos, e existem etapas a cumprir de forma contínua e cumulativa. Rist rejeita a possibilidade de que, em matéria de desenvolvimento, seria possível antecipar de modo determinista os passos futuros a serem seguidos pelas economias do Sul e, além do mais, definir as ferramentas para atingir determinados objetivos de maneira universal e independente de contextos e lógicas locais (Rist, 1999 apud Milani, 2005).
Como o modelo evolucionista que distingue as raças humanas, dentro dos estudos antropológicos do século XVIII, a construção de uma verdade absoluta em torno da história do homem, feita por determinados grupos de homens que se auto-determinam “evoluídos”, ainda estão arraigadas na memória do homem ocidental e são apresentadas na forma de extremismos, exclusão e violência.
Os ditos parâmetros de crescimento e inovação podem abranger uma minoria ou assistir milhares de pessoas no mundo todo – com técnicas, marcas e até mesmo estilos de vida. São recursos promovidos e que trazem, quando adequadas às realidades locais ou pessoais, determinado capital social.
Em diversos sentidos, o capital social se aproxima mais do capital humano do que do capital físico. Ele também é intangível, mas sua quantificação é mais complexa do que o capital humano, já que é observada nas relações entre os indivíduos (COLEMAN, 1988; REQUIER-DESJARDINS, 2000 apud MONASTERIO, 2000).
Outros autores e intelectuais como Wolfgang Sachs, Serge Latouche, Ivan Illich e Arundathy Roy afirmaram ser fundamental analisar e requalificar criticamente os processos de transformação social vistos sob a etiqueta do desenvolvimento. Estes autores, por mais que não tivessem apresentado um novo conceito e prática do desenvolvimento a partir do capital social que substituísse o anterior, denunciaram as práticas incoerentes do desenvolvimento econômico e seus resultados nocivos, sobretudo nos contextos onde as desigualdades e as carências de infra e superestrutura são muito evidentes.
Outro importante impacto da corrida pelo desenvolvimento econômico que atropela valores sociais acontece nas relações entre os indivíduos em sociedade. Estando as associações de interesses comuns diminuindo sua prática, é visto que, com o distanciamento entre seus componentes, a competição vem tomando o lugar da confiança. Isto ocorre principalmente nas sociedades de ideal democrático e com este histórico, como o caso dos EUA, onde foi produzido “Democracia na América” de Tocqueville e “Bowling Alone” de Putnam.
Assim como na pesquisa de Putnam, diversos estudos estão sendo produzidos a partir da observação deste crescente individualismo nas sociedades. Como Putnam em “Bowling alone”, o sociólogo polonês Zygmunt Bawman observa, em Modernidade Líquida, com seu olhar “romântico”, o esfacelamento dos laços de amizade e cooperação até então fundamentais para o desenvolvimento social.
Acrescenta ainda que, nas sociedades por ele denominadas pós-modernas inseridas grandes cidades-centros comerciais, a liquidez e a efemeridade na absorção das informações e na construção das imagens são características marcantes. Estando dispostas a um grande e variado número de recursos, as possibilidades e oportunidades se alargam tornando a experiência cotidiana uma entrada e saída de informações e escolhas. Em alta velocidade e pretendendo entrar em contato com o máximo de conhecimento possível, os indivíduos se isolam e criam novos mecanismos de sociabilizar-se.
A comunicação, portanto, vem adquirindo novos meios de conexão e transmissão das suas mensagens, seus conteúdos também se adequam aos novos interesses de seus receptores. Na comunicação e na viabilização de conhecimento é necessário atentar para as constantes tendências - do capital social.
Em relação às estimativas de queda dos números de associações, feita por Putnam, verifico que as características de muitas associações mudaram – talvez tenham deixado de ser de bairro, de esportes de grupo presencial ou de jantares com amigos. As redes sociais caracterizam-se por serem traçadas também pela internet, por celulares, em restaurantes e em ambientes públicos. Talvez tenha deixado de ser tão privativa a famílias e grupos específicos e tenha se colocado em disposição mais alargada, com maior incidência de novidades e referências. Afinal de contas o que se ganhou com a confiança e a cooperação pode também ter sido a tolerância com a diversidade.
As características individualistas também agregam valores e são potencialmente capazes de gerar desenvolvimento social. Mudança social é mudança nos componentes e nas relações entre os componentes do conjunto que constitui a sociedade. Usando metaforicamente a linguagem econômica, poderíamos dizer que haverá mudanças sociais quando houver alterações do capital humano e do capital social.
Capital Social, Tendências e Construções
por Cristine de Carvalho
A partir dos anos 90, o Banco Mundial passou a distinguir, na avaliação de projetos de desenvolvimento, as quatro formas de riqueza das nações. Dentro das estatísticas do ano de 1998, para o Banco, 16% da riqueza mundial advém de fatores físicos e financeiros, isto é, do mercado de capitais (estradas, fábricas, e o sistema produtivo em geral); Ocupando cerca de 20% está o chamado Nature Lendal, e refere-se a fatores naturais (território, espaço, localização geoestratégica, história, tradição, etc.); e finalmente, 64% corresponde àquilo que o Banco Mundial chamou de Capital humano e social.
O Capital humano é definido pelos graus de saúde, educação e nutrição de um povo; ele pode ser mensurado através de Indicadores, como o IDH, onde são avaliadas as condições e tendências em relação à metas e objetivos, dentro de temas como mortalidade infantil, expectativa de vida, analfabetismo, etc.
No entanto, para alguns autores, como MacGillivray (1997), uma vez que os pré-requisitos para o desenvolvimento humano sejam atendidos (capital humano), as pessoas devem utilizar esse potencial para exercer uma vida plena de significados dentro da sociedade. O autor afirma que a participação dentro da sociedade é mais do que a inexistência de obstáculos (capital humano) para se alcançar alguns objetivos. Existem, segundo ele, meios de se definir o desenvolvimento social não-individual. O principal meio é como continua o autor, o capital social.
Concepções de Capital Social
Na corrente da mudança de perspectiva do conceito de "comunidade" para "redes sociais", vários autores das ciências sociais passaram a investigar, desde os anos de 1990, o conceito empírico de capital social (Burt, 2005; Lin, 2005; Narayan, 1999; Portes, 1998; Grootaert, 1997; Fukuyama, 1996; Putnam, 1993; Coleman, 1990).
James Coleman (1990) aplica o conceito na área da educação e analisa seu papel no crescimento do capital humano, em uma abordagem baseada na escolha racional. Para este autor, capital social é um recurso que representa a habilidade das pessoas de trabalharem juntas para um fim comum em grupos ou dentro das organizações.
O autor aponta, com dados estatísticos sobre a sociedade norte-americana, a importância do capital social para a obtenção de capacidades e qualificações que elevam a produtividade do trabalho humano.
Putnam (1994)[1] descreve o capital social como uma característica da organização social, como as redes, onde as normas facilitam a coordenação e cooperação em benefício mútuo. Tais associações fornecem a base de cooperação dentro da sociedade e o capital social pode ser descrito como a participação do processo decisório ou integração social.
O capital individual é um estoque de competências, qualidades e aptidões enquanto que o capital social, um estoque de relações e valores. Segundo Putnam, as normas de reciprocidade (ajuda mútua) estabelecidas na relação entre os indivíduos é o que caracteriza o capital social de uma sociedade. Graças ao motivo que aproxima as pessoas, interesses em comum ou não: “bonding” – interesses similares e “bridging”, interesses diversos.
Para este autor, dentro os benefícios das sociedades com alto capital social estão: a diminuição dos crimes em lugares onde as pessoas conhecem seus vizinhos; a melhora do desempenho de estudantes quando os pais estão mais envolvidos nas relações comunitárias; melhor trabalho do governo quando as pessoas estão envolvidas na vida cívica; e o aumento da realização econômica quando do aumento da confiança.
Putnam afirma que a tradução da mentalidade do “eu” para o “nós” advém de redes sociais marcadas pela confiança, normas e sistemas de larga solidariedade, criadas a partir das contínuas interações entre os indivíduos. Assim, os sistemas de participação cívica são a forma essencial de capital social, e quanto mais desenvolvidos forem esses sistemas numa comunidade, maior será a probabilidade de que seus cidadãos sejam capazes de cooperar em benefício coletivo.
Um ambiente de confiança plena conta com um importante recurso a ser aplicado na solução de muitos problemas e por isso permite a ampliação das possibilidades, estimulando inovações. Tais recursos estão relacionados tanto à cultura familiar quando à esfera política e econômica.
Para Putnam, as redes de relações propiciam o fluxo e o intercâmbio de informações (compartilhamento) reproduzindo espaços de comunicação. Na interação dentro destes espaços, as associações engendram hábitos cívicos, confiança e um espírito cooperativo, o que vem a contribuir com o desenvolvimento, tanto social como econômico. Esta é, segundo o autor, uma função chave para sistemas ricos em capital social.
Os resultados de testes empíricos cross-section sugerem que os países com maior intensidade de capital social (redes e associações) teriam maior taxa de acumulação de capital físico – bens materiais ou de valor quantitativamente avaliável e comparável.
Finalmente, o capital individual pode ser visto como atributo particular ao agente social, mas a rede de conexões entre estes indivíduos e suas qualidades é um ativo que gera benefícios principalmente para os mesmos. O ambiente de rede torna a experiência cotidiana plena (até mesmo direcionada, normatizada, ordenada) o que é socialmente favorável pelos recursos dados ao seu potencial de sustentabilidade (desenvolvimento social sustentável).
Em pesquisas recentes (2001), Putnam identifica uma grande queda nas taxas de capital social nos EUA nos últimos 25 anos: 58% na participação de clubes e outras organizações civis; 33% em jantares familiares; 33% em presença nas igrejas; 45% em amizades por algum fim; e 35% no envolvimento na vida comunitária (encontros públicos).
Ultrapassando a definição de capital social enquanto qualidade das redes sociais e das relações entre os indivíduos, Dominique Meda considera a sociedade, a nação, e o país como um todo, um coletivo que também possui um bem próprio. O capital social é chamado por Meda de “estado social da nação” (etat social de la nation). A sociedade disporia, segundo a autora, de um certo número de bens e recursos, de uma certa quantidade de capitais, cuja progressão, melhora, acumulação e qualidade também podem ser medidas (Meda, 2002 apud Milani, 2005).
Seu uso tende a aumentar seu estoque por meio de ações que incentivam sua criação e reprodução (redes, comunicação, apoio e cooperação). Diminui, porém, na medida em que florescem atitudes e comportamentos relacionados com a intolerância, a discriminação e o desrespeito pelos direitos da pessoa humana, bem como restrições à liberdade de expressão e organização políticas, a diminuição dos espaços públicos de deliberação democrática e a falta de reconhecimento dos direitos de grupos minoritários ou excluídos.
Molyneux (2002, apud Milani, 2005), vê ainda que o capital social pode ser entendido enquanto propriedade de uma sociedade (civicness), propriedade de uma comunidade ou um recurso operacionalizado por indivíduos a fim de maximizar suas capacidades e atingir seus objetivos. É propriedade da sociedade como um todo porque, além de ser um fator central na equação do desenvolvimento e fundamental para a vida econômica, seu valor social ultrapassa sua utilidade econômica.
Não me detendo aos aspectos da contabilidade empresarial, mas ainda tendo como recurso inerente à vida social, o capital social é, segundo Márcio Schiavo, a moeda de troca entre os membros da rede social. Ao assistirmos a crise de cidadania atual, ou da cooperação e do sentimento de pertencimento à uma classe ou um país, e associarmos que as soluções para esta crise está na administração do capital social, se chega a conclusão de que é necessário que o déficit seja pago com este mesmo capital social, desenvolvido.
O déficit de cidadania é segundo Schiavo, pago através do restabelecimento dos vínculos sociais, do fluxo de capital social ativo e da então diminuição das probabilidades de exclusão. O poder público é, dentro desta perspectiva, a rede de valores sociais, e envolve a participação e a cooperação do conjunto de indivíduos, assim como colocado por Putnam.
Ainda é importante enfatizar que o capital social não substitui a efetiva política publica. Segundo Putnam “é um requisito para ela; o capital social trabalha entre e com os estados e os mercados e não no lugar deles. Também não o é nem um argumento para determinismos culturais nem um motivo para culpar a vítima... uma sabia política sabe encorajar a formação do capital social, e o próprio capital social aumenta a eficácia da ação de governo”[2].
O déficit social e a decorrente pobreza não são problemas unicamente econômicos, pela falta de crescimento, ou tão pouco é um problema da falta de oferta eficiente e suficiente de serviços estatais.
Não menos importante do que os impactos do capital físico, o capital social cria condições para que o indivíduo em sua totalidade e a sociedade como unidade, baseados em relações de confiança, gerem uma economia socialmente produtiva.
Ainda que responda às inclinações individuais, o capital social não deixa de ser um bem público constituído na necessidade de reciprocidade na relação entre os diversos interesses pessoais envolvidos, e se manifesta a partir da confiança, de normas e de cadeias de relações sociais.
Em um mundo de fluxos globais de riqueza, poder e imagens é crescente a busca da fonte básica de significado social: da identidade - coletiva ou individual, atribuída ou construída.
A qualidade da relação entre os agentes da rede social é o que dá sentido ao desenvolvimento da sociedade onde estão inseridos.
[1] Robert Putnam aplicou o conceito na compreensão da participação e engajamento da sociedade e os seus efeitos nas instituições democráticas e na qualidade do governo em algumas regiões da Itália.
[2] Putnam, 2004. “Interview to OECD Observer about Bowling together.”
O Capital humano é definido pelos graus de saúde, educação e nutrição de um povo; ele pode ser mensurado através de Indicadores, como o IDH, onde são avaliadas as condições e tendências em relação à metas e objetivos, dentro de temas como mortalidade infantil, expectativa de vida, analfabetismo, etc.
No entanto, para alguns autores, como MacGillivray (1997), uma vez que os pré-requisitos para o desenvolvimento humano sejam atendidos (capital humano), as pessoas devem utilizar esse potencial para exercer uma vida plena de significados dentro da sociedade. O autor afirma que a participação dentro da sociedade é mais do que a inexistência de obstáculos (capital humano) para se alcançar alguns objetivos. Existem, segundo ele, meios de se definir o desenvolvimento social não-individual. O principal meio é como continua o autor, o capital social.
Concepções de Capital Social
Na corrente da mudança de perspectiva do conceito de "comunidade" para "redes sociais", vários autores das ciências sociais passaram a investigar, desde os anos de 1990, o conceito empírico de capital social (Burt, 2005; Lin, 2005; Narayan, 1999; Portes, 1998; Grootaert, 1997; Fukuyama, 1996; Putnam, 1993; Coleman, 1990).
James Coleman (1990) aplica o conceito na área da educação e analisa seu papel no crescimento do capital humano, em uma abordagem baseada na escolha racional. Para este autor, capital social é um recurso que representa a habilidade das pessoas de trabalharem juntas para um fim comum em grupos ou dentro das organizações.
O autor aponta, com dados estatísticos sobre a sociedade norte-americana, a importância do capital social para a obtenção de capacidades e qualificações que elevam a produtividade do trabalho humano.
Putnam (1994)[1] descreve o capital social como uma característica da organização social, como as redes, onde as normas facilitam a coordenação e cooperação em benefício mútuo. Tais associações fornecem a base de cooperação dentro da sociedade e o capital social pode ser descrito como a participação do processo decisório ou integração social.
O capital individual é um estoque de competências, qualidades e aptidões enquanto que o capital social, um estoque de relações e valores. Segundo Putnam, as normas de reciprocidade (ajuda mútua) estabelecidas na relação entre os indivíduos é o que caracteriza o capital social de uma sociedade. Graças ao motivo que aproxima as pessoas, interesses em comum ou não: “bonding” – interesses similares e “bridging”, interesses diversos.
Para este autor, dentro os benefícios das sociedades com alto capital social estão: a diminuição dos crimes em lugares onde as pessoas conhecem seus vizinhos; a melhora do desempenho de estudantes quando os pais estão mais envolvidos nas relações comunitárias; melhor trabalho do governo quando as pessoas estão envolvidas na vida cívica; e o aumento da realização econômica quando do aumento da confiança.
Putnam afirma que a tradução da mentalidade do “eu” para o “nós” advém de redes sociais marcadas pela confiança, normas e sistemas de larga solidariedade, criadas a partir das contínuas interações entre os indivíduos. Assim, os sistemas de participação cívica são a forma essencial de capital social, e quanto mais desenvolvidos forem esses sistemas numa comunidade, maior será a probabilidade de que seus cidadãos sejam capazes de cooperar em benefício coletivo.
Um ambiente de confiança plena conta com um importante recurso a ser aplicado na solução de muitos problemas e por isso permite a ampliação das possibilidades, estimulando inovações. Tais recursos estão relacionados tanto à cultura familiar quando à esfera política e econômica.
Para Putnam, as redes de relações propiciam o fluxo e o intercâmbio de informações (compartilhamento) reproduzindo espaços de comunicação. Na interação dentro destes espaços, as associações engendram hábitos cívicos, confiança e um espírito cooperativo, o que vem a contribuir com o desenvolvimento, tanto social como econômico. Esta é, segundo o autor, uma função chave para sistemas ricos em capital social.
Os resultados de testes empíricos cross-section sugerem que os países com maior intensidade de capital social (redes e associações) teriam maior taxa de acumulação de capital físico – bens materiais ou de valor quantitativamente avaliável e comparável.
Finalmente, o capital individual pode ser visto como atributo particular ao agente social, mas a rede de conexões entre estes indivíduos e suas qualidades é um ativo que gera benefícios principalmente para os mesmos. O ambiente de rede torna a experiência cotidiana plena (até mesmo direcionada, normatizada, ordenada) o que é socialmente favorável pelos recursos dados ao seu potencial de sustentabilidade (desenvolvimento social sustentável).
Em pesquisas recentes (2001), Putnam identifica uma grande queda nas taxas de capital social nos EUA nos últimos 25 anos: 58% na participação de clubes e outras organizações civis; 33% em jantares familiares; 33% em presença nas igrejas; 45% em amizades por algum fim; e 35% no envolvimento na vida comunitária (encontros públicos).
Ultrapassando a definição de capital social enquanto qualidade das redes sociais e das relações entre os indivíduos, Dominique Meda considera a sociedade, a nação, e o país como um todo, um coletivo que também possui um bem próprio. O capital social é chamado por Meda de “estado social da nação” (etat social de la nation). A sociedade disporia, segundo a autora, de um certo número de bens e recursos, de uma certa quantidade de capitais, cuja progressão, melhora, acumulação e qualidade também podem ser medidas (Meda, 2002 apud Milani, 2005).
Seu uso tende a aumentar seu estoque por meio de ações que incentivam sua criação e reprodução (redes, comunicação, apoio e cooperação). Diminui, porém, na medida em que florescem atitudes e comportamentos relacionados com a intolerância, a discriminação e o desrespeito pelos direitos da pessoa humana, bem como restrições à liberdade de expressão e organização políticas, a diminuição dos espaços públicos de deliberação democrática e a falta de reconhecimento dos direitos de grupos minoritários ou excluídos.
Molyneux (2002, apud Milani, 2005), vê ainda que o capital social pode ser entendido enquanto propriedade de uma sociedade (civicness), propriedade de uma comunidade ou um recurso operacionalizado por indivíduos a fim de maximizar suas capacidades e atingir seus objetivos. É propriedade da sociedade como um todo porque, além de ser um fator central na equação do desenvolvimento e fundamental para a vida econômica, seu valor social ultrapassa sua utilidade econômica.
Não me detendo aos aspectos da contabilidade empresarial, mas ainda tendo como recurso inerente à vida social, o capital social é, segundo Márcio Schiavo, a moeda de troca entre os membros da rede social. Ao assistirmos a crise de cidadania atual, ou da cooperação e do sentimento de pertencimento à uma classe ou um país, e associarmos que as soluções para esta crise está na administração do capital social, se chega a conclusão de que é necessário que o déficit seja pago com este mesmo capital social, desenvolvido.
O déficit de cidadania é segundo Schiavo, pago através do restabelecimento dos vínculos sociais, do fluxo de capital social ativo e da então diminuição das probabilidades de exclusão. O poder público é, dentro desta perspectiva, a rede de valores sociais, e envolve a participação e a cooperação do conjunto de indivíduos, assim como colocado por Putnam.
Ainda é importante enfatizar que o capital social não substitui a efetiva política publica. Segundo Putnam “é um requisito para ela; o capital social trabalha entre e com os estados e os mercados e não no lugar deles. Também não o é nem um argumento para determinismos culturais nem um motivo para culpar a vítima... uma sabia política sabe encorajar a formação do capital social, e o próprio capital social aumenta a eficácia da ação de governo”[2].
O déficit social e a decorrente pobreza não são problemas unicamente econômicos, pela falta de crescimento, ou tão pouco é um problema da falta de oferta eficiente e suficiente de serviços estatais.
Não menos importante do que os impactos do capital físico, o capital social cria condições para que o indivíduo em sua totalidade e a sociedade como unidade, baseados em relações de confiança, gerem uma economia socialmente produtiva.
Ainda que responda às inclinações individuais, o capital social não deixa de ser um bem público constituído na necessidade de reciprocidade na relação entre os diversos interesses pessoais envolvidos, e se manifesta a partir da confiança, de normas e de cadeias de relações sociais.
Em um mundo de fluxos globais de riqueza, poder e imagens é crescente a busca da fonte básica de significado social: da identidade - coletiva ou individual, atribuída ou construída.
A qualidade da relação entre os agentes da rede social é o que dá sentido ao desenvolvimento da sociedade onde estão inseridos.
[1] Robert Putnam aplicou o conceito na compreensão da participação e engajamento da sociedade e os seus efeitos nas instituições democráticas e na qualidade do governo em algumas regiões da Itália.
[2] Putnam, 2004. “Interview to OECD Observer about Bowling together.”
quinta-feira, 10 de abril de 2008
Globalizar o paradigma do desenvolvimento sustentável
“Quando as corporações recebem licença para poluir e contaminar estão recebendo licença para matar” (Robert Bullar)
É claro que muito já foi conquistado desde a criação dos movimentos ecológicos e ambientalistas. A agricultura ecológica foi difundida como alternativa; as emissões de CFC – clorofluorcarboneto – foram minimamente limitadas; os alimentos transgênicos têm sido publicamente criticados e na Europa são pouco comercializados; programas de combate a condições de extrema pobreza foram construídos; contra a globalização orientada apenas por interesses econômicos foi desenvolvida uma resistência internacional. Mas, embora se possa afirmar que a opinião pública se manifesta mais interessada pelo meio ambiente e que a “Agenda 21” se tornou mundialmente famosa, muito do que há dez anos foi assumido como compromisso pelos governos ainda não foi concretizado.
O desenvolvimento sustentável é tratado como mera utopia e/ou simpático conceito para discursos; a crise social e ecológica tem-se aprofundado em esfera global com o super aquecimento do planeta, a destruição da biodiversidade, a desertificação, o desmatamento, a contaminação e a escassez de água potável, ínsitos ao crescimento do abismo que separa ricos e pobres no mundo. Muitos recursos biológicos são apropriados comercialmente e muitas espécies vêm sendo extintas ou exterminadas em função da sua utilização pela biotecnologia. Os programas de desenvolvimento situam-se num dos mais baixos patamares da história. Entretanto, o livre mercado e a organização financeira são colocados como prioridade acima de tudo, exatamente como tem recomendado a Organização Mundial do Comércio, edificada como poder mundial desde 1994. Os Estados Unidos, o país mais poluidor do mundo, têm-se negado a assinar o Protocolo de Kyoto que, entre outras resoluções, exige a limitação de emissões de dióxido de carbono em 7%. Eles sozinhos foram apresentados em 1990 como responsáveis por 36% da emissão de dióxido de carbono e em 1998 foi constatado que, ao invés de serem reduzidas, as emissões nos EUA aumentaram em 3,7%. Apesar da negativa diante dos acordos internacionais e do aumento da poluição, o governo norte-americano não sofreu nenhuma advertência por parte da “comunidade internacional”. Esse é o maior problema: como obrigar um país tão poderoso a seguir condições gerais se ele não respeita nenhuma recomendação e a Organização das Nações Unidas, sediada nos Estados Unidos, não toma nenhuma posição em relação a isso?
A pergunta é, evidentemente: como inserir sustentabilidade e economia ecológica na atual globalização? Organizações ambientais alemãs se esforçam em divulgar esta situação e esperam que em Joanesburgo se consiga, pelo menos, constituir uma Comissão Mundial para para a temática sustentabilidade e globalização e que a discussão ambiental possa ser tornada cada vez mais pública. O estilo de vida desperdiçador, possibilitado pela economia capitalista, precisa ser modificado para que pessoas não sejam exterminadas e para que nenhuma lei possa servir como permissão para destruir a vida.
É claro que muito já foi conquistado desde a criação dos movimentos ecológicos e ambientalistas. A agricultura ecológica foi difundida como alternativa; as emissões de CFC – clorofluorcarboneto – foram minimamente limitadas; os alimentos transgênicos têm sido publicamente criticados e na Europa são pouco comercializados; programas de combate a condições de extrema pobreza foram construídos; contra a globalização orientada apenas por interesses econômicos foi desenvolvida uma resistência internacional. Mas, embora se possa afirmar que a opinião pública se manifesta mais interessada pelo meio ambiente e que a “Agenda 21” se tornou mundialmente famosa, muito do que há dez anos foi assumido como compromisso pelos governos ainda não foi concretizado.
O desenvolvimento sustentável é tratado como mera utopia e/ou simpático conceito para discursos; a crise social e ecológica tem-se aprofundado em esfera global com o super aquecimento do planeta, a destruição da biodiversidade, a desertificação, o desmatamento, a contaminação e a escassez de água potável, ínsitos ao crescimento do abismo que separa ricos e pobres no mundo. Muitos recursos biológicos são apropriados comercialmente e muitas espécies vêm sendo extintas ou exterminadas em função da sua utilização pela biotecnologia. Os programas de desenvolvimento situam-se num dos mais baixos patamares da história. Entretanto, o livre mercado e a organização financeira são colocados como prioridade acima de tudo, exatamente como tem recomendado a Organização Mundial do Comércio, edificada como poder mundial desde 1994. Os Estados Unidos, o país mais poluidor do mundo, têm-se negado a assinar o Protocolo de Kyoto que, entre outras resoluções, exige a limitação de emissões de dióxido de carbono em 7%. Eles sozinhos foram apresentados em 1990 como responsáveis por 36% da emissão de dióxido de carbono e em 1998 foi constatado que, ao invés de serem reduzidas, as emissões nos EUA aumentaram em 3,7%. Apesar da negativa diante dos acordos internacionais e do aumento da poluição, o governo norte-americano não sofreu nenhuma advertência por parte da “comunidade internacional”. Esse é o maior problema: como obrigar um país tão poderoso a seguir condições gerais se ele não respeita nenhuma recomendação e a Organização das Nações Unidas, sediada nos Estados Unidos, não toma nenhuma posição em relação a isso?
A pergunta é, evidentemente: como inserir sustentabilidade e economia ecológica na atual globalização? Organizações ambientais alemãs se esforçam em divulgar esta situação e esperam que em Joanesburgo se consiga, pelo menos, constituir uma Comissão Mundial para para a temática sustentabilidade e globalização e que a discussão ambiental possa ser tornada cada vez mais pública. O estilo de vida desperdiçador, possibilitado pela economia capitalista, precisa ser modificado para que pessoas não sejam exterminadas e para que nenhuma lei possa servir como permissão para destruir a vida.
quarta-feira, 9 de abril de 2008
SER - do dificil para o simples - filosofia visivel
Interessante pensar sobre os possiveis paramentros mundialmente (ou sistematicamente) construidos em torno do impulso desenvolvimentista. No passo acelerado a que andamos (sociedade capital) uma forte densidade demografica mantem o velho argumento de que ainda se faz necessario deixar crescer o bolo para entao dividir. Modelo onde o aparentemente precavido longo prazo traz pro presente a angustiante (e porque nao sufocante) posicao de observadores, despreparados, recebedores de ordens, prestadores obedientes do que "os outros" demandam em sua mega estrutura de lider.
E entao me pergunto... porque nao a proatividade, a continuidade de um percurso em respeito a historia e a confianca de que situacoes vividas sao situacoes aprendidas e que hoje, nao mais uma rota seja necessario seguir, mas ja que maduro, perceber seu proprio destino, olhar pro propro umbigo e amar seus proprios lacos em suas nobres e confortaveis camas, no pulso de seu povo. Trata-se de garantir que o desenvolvimento de qualquer um em qualquer lugar seja apenas dependente de suas forcas - que nao haja sobrevivencia, mas afirmacao de que na escola da tradicao se aprendeu a ser feliz. E que esta felicidade nao vai embora nem se esconde. Ela esta ali, onde voce mais confia e ve.
Nacoes, pessoas ou qualquer que seja a linguagem de poder, divirta-se em fazer o bolo. A velha bruxa queimada em praca publica apenas ensinava isso. A resposta esta em cada dobra do vestido (a lembrar Benjamin), na constituicao mais simples de todo SER. 

segunda-feira, 7 de abril de 2008
Breve rapidinha: Crédito de carbono
O princípio do crédito de carbono é o seguinte: alguns países (em geral os desenvolvidos, com processos de industrialização mais antigos) têm metas, fixadas pelo Protocolo de Kyoto, para reduzir suas emissões de carbono no meio ambiente e, assim, minimizar o efeito estufa. Desta forma, aqueles que reduziram a emissão de carbono mais do que o necessário “vendem” esse excedente aos que precisam diminuir suas emissões. “Com a oportunidade de aproximar a questão ambiental à financeira criou-se um mercado promissor”, diz Ricardo Valente, diretor da consultoria de gestão ambiental Key Associados, de São Paulo. O Brasil é responsável pela venda de 7% das mais de 4 milhões de toneladas de créditos de carbono no mundo e já é o terceiro maior vendedor, atrás da China (50%) e da Índia (23%).
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